01/11/2018 - 14:35h
Quase todos os líderes empresariais que conheço temem ser superados por algum arrogante especialista em tecnologia. Esse medo leva as empresas a investirem milhões no desenvolvimento de inovações revolucionárias. Porém, uma quantidade alarmante desses investimentos dá errado. A verdade é que pode estar tudo certo: sua carteira de investimentos, os indicadores de desempenho e a governança, o processo de desenvolvimento stage-gate; você pode contar com o talento certo na equipe certa. Contudo, se não fizer as transferências corretas entre as equipes, todo o seu planejamento vai por água abaixo.
Eis um exemplo: uma das mais importantes empresas de eletrônicos asiática construiu um laboratório de design para desenvolver novas ideias para a produção de hardwares. Com demasiada frequência, quando a equipe do laboratório transmitia o conceito a um gerente de produção, como por exemplo, um computador customizado para modeladores 3D e editores de filmes, este ignorava o raciocínio da equipe e simplesmente aplicava o design físico do computador a um produto que já estava em desenvolvimento — como um computador de baixa potência destinado a estudantes no período de volta às aulas. Quando as vendas do produto Frankenstein não atingiam a meta, todos dividiam a culpa. Essa empresa não tinha um plano definido para realizar a transferência do projeto da pequena equipe de design para a equipe de produção. Não conseguiam fazer a travessia do abismo entre os dois setores.
Como evitar a queda no abismo? Entrelaçando as equipes no processo. Em muitas empresas, as equipes de inovação tendem a se situar em uma das seguintes categorias: exploradoras, niveladoras e otimizadoras (com créditos para Bud Caddell e Simon Wardley). As otimizadoras compõem o núcleo da maioria das empresas bem estabelecidas — são especializadas em aperfeiçoar e fortalecer aquilo que já existe para gerar crescimento ou aprimorar as operações. As exploradoras trabalham em equipes como P&D (pesquisa e desenvolvimento), na visão dos clientes ou no desenvolvimento de produtos. Esse último grupo é qualificado para descobrir novas oportunidades em face das ambiguidades — traduz a inspiração em ideias usando métodos como o design thinking. As niveladoras fazem repetidas experiências e ajustam novas ideias até encontrarem o encaixe perfeito entre produto e mercado usando métodos como o agile e o lean. Esses rótulos também descrevem bem as fases da inovação: exploração, nivelação e otimização.
Como criar uma transferência mais fluida entre as equipes? Existem quatro modelos básicos e dezenas de híbridos. O correto para cada parte de seu portfólio de inovação vai depender da medida em que os seus projetos precisam estar integrados com sua atividade principal.
Essa é ao mesmo tempo a transferência mais comum e a mais difícil de ser executada. Após meses — às vezes anos — de trabalho, a equipe de inovação documenta seu trabalho de maneira extensa, em centenas de slides, planilhas e outros arquivos e, então, entregam tudo isso para que a outra equipe execute. Qual foi a última vez que você leu um manual de instruções? Exatamente. Você só consulta o manual em um momento de pânico, quando alguma coisa quebra. Nesse modelo, uma assustadora parte do trabalho de inovação é apenas folheada e esquecida. Em seguida, a nova equipe se arrisca a continuar o projeto sem ter absorvido o conhecimento de seus predecessores. Este modelo funciona melhor quando não há mais incertezas no desafio, quando o projeto está pronto para ser implementado por equipes técnicas e quando o manual pode ser dividido em capítulos pequenos, específicos e aplicáveis a cada uma das partes envolvidas.
A melhor maneira de evitar a queda é eliminar o abismo. Neste modelo, o futuro detentor do projeto é incorporado às equipes exploradoras e niveladoras. Então, essa pessoa passa a agir como um conector, já conhecendo todas a vias exploradas e todo o conhecimento adquirido. É um modelo forte para setores como o de mercadorias embaladas, em que uma pessoa, como o gerente da marca, é responsável pelo desenvolvimento do produto do início ao fim. Embora o Arquiteto possa não estar liderando o projeto em todas as fases, precisará dar sua aprovação final ao trabalho da equipe. Se não acreditar no projeto, acabará pondo um fim ao conceito.
É similar ao modelo anterior. Neste, os membros das equipes exploradora, niveladora e otimizadora são incorporados a todas as fases do projeto para assegurar que nenhum conhecimento seja perdido, e que cada fase seja definida para que o projeto passe de forma fluida de uma para a outra. Além disso, esse modelo melhora o trabalho futuro das equipes de inovação, ajudando-as a ter consciência daquilo que as equipes mais precisam no processo que vai da criação à finalização do produto. Esse modelo é mais comum nas equipes de desenvolvimento de softwares, em que o designer UX (Experiência do Usuário, na sigla em inglês) pode estar envolvido tanto na pesquisa inicial de usuários quanto na gestão a longo prazo do produto.
Neste modelo, equipes multidisciplinares enfrentam desafios ao longo de todo o ciclo de vida da iniciativa. É o mais comum nas aceleradoras e incubadoras, em que uma nova organização é estabelecida como um microcosmos de uma matriz e composta por pessoas de todas as funções e disciplinas mais importantes. Equipes Colmeia também têm representantes de funções que normalmente agem como anticorpos empresariais, como jurídica, financeira, RH e compliance. A Colmeia faz com que essas funções de proteção mudem a postura de eliminar riscos para a de reduzi-los — de dizer “não” para “não, mas…”.
Além do Manual de Instruções, todos os outros modelos de transferência trazem as equipes de implementação para participar de todo o processo de inovação, de forma a transferir conhecimento sem obstáculos. Essa medida reduz a sensação de que a nova ideia não foi inventada ali, e faz com que a transferência seja menos parecida com tentar beber água de uma mangueira de incêndio e mais com tomar pequenos goles de cada vez.
Joe Brown é diretor de portfólio na IDEO, empresa de design e consultoria em inovação. Antes da IDEO, ministrou cursos de Comportamento em Marketing e Organização na Stanford Graduate School of Business, onde também obteve seu MBA.
Tradução: Sarah Nikitin
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