Professor Judson Santos
Indiferente a qualquer data especial e sem pedir licença, a minha natureza tão humana, muito bela, invariavelmente inquietante e complexa, de uma hora pra outra resolve me entregar solitário nas minhas profundas realidades existenciais. Assim, do nada, na maior cara de pau, e em plena quarta feira ela inventa aflorar o pior de mim - limitações, dores existenciais e fraquezas. Mas ela faz isto não é de vez em quando. Semana passada ele teve a ousadia em fazer que eu sinta inúmeras fraquezas acinzentadas. Também noutro dia acordei, fui ao espelho e pude perceber nitidamente a total limitação delineada no meu ser e no meu fazer diário. Puxa! Precisa mostrar na cara? A minha natureza é bem desumana para o meu gosto. Impiedosamente desumana. E não fica só nisso. Subitamente ela chama um conflito para dentro de mim e o empurra nas minhas emoções, na minha espiritualidade. Chama a limitação e arma uma barraca de frustrações que se abrigam justamente no território do meu sentimento.
Dá-se um camping de miséria esparramada em mim. Como se não fosse pouco, ainda pede reforço: depressão, mágoa, decepção, insatisfação... Vem! Grita ela. Venham para este receptáculo humano! - a fraqueza grita. Para o meu desespero, uma a uma todas obedecem. Sem muito barulho se instalam. E ainda insiste a fraqueza no chamamento. Para enfraquecer a fraqueza é forte. Vai chamando, gritando, convocando toda a família de miseráveis, espalhando um cheiro insuportável de fracassos para o grande churrasco nos cantos mais sensíveis de mim. Quanto mais sensível o meu sentir, maior o tamanho da churrasqueira. Todos bebem! Bebem feitos dementes. Dançam. A minha mente fica zonza. Nesta tontura insana, buscam tomar posse da minha mente e do meu querer. Já não decido. Estou fraco demais para isto. Nesta bagunça geral, e como se não fosse pouco, a fraqueza e a limitação se unem para se auto-elegerem senhoras do meu pensar. Não penso mais forte. Só penso fraco. Vaidosas nas suas insuficiências canalizam o foco de mim para mim mesmo, me fazendo pensar que não há mais força em mim. Assim, as indesejáveis senhoras intrusas e fétidas, se prostituem numa orgia voraz estuprando a inocência da minha sensibilidade. Sinto-me violentado. Torno-me insatisfeito por não ser um super-alguma-coisa com poder para emitir um raio ultra poderoso e que despacha o mal para o mal. Ou por não falar um palavrão, destes que o mal considera aviltante: sua filha do mal vá pra longe e faça-se extinto! No meio de tanto desconforto existencial, sigo o meu caminho. Mas tenho que fazer alguma coisa para me libertar deste excessivo lixo de mim.
As ruas podem ser os primeiros refúgios dos que procuram sair da caverna da angústia. Sigo um destino qualquer, uma rua qualquer... Quando olho ao redor... Ah!... Legal! Lanchonetes, shoppings, carros, prédios residências, cinemas, mais lojas, liquidação, produto novo no mercado estampado em cartazes gigantes nas portas dos que vendem. Ôpa! Sinal de pare. Pare para mim ou pare para quem está no veículo? Entendi... Verde para mim e vermelho para os veículos. Atravesso. Mas para onde estou indo? Perco-me em meu próprio silêncio. Não tenho respostas. Saio de mim para fugir de mim, mas eu continuo aqui comigo? Ah!... Eu estou sempre presente em mim mesmo. Tento mas não consigo ausentar-me de mim. Lembro-me agora do que disse o escritor bíblico, o apóstolo Paulo, mais ou menos assim: dentro de mim há uma guerra do quero ser e do não quero ser! Acho que o apóstolo estava com raiva dele mesmo naquele momento. Afinal, separar duas realidades na sua mais indissociável simbiose é uma tarefa humanamente impossível.
É... Volto à minha realidade. Continuo fugindo do que me limita, do que me faz pensar pequeno. Continuo na minha peregrinação mais interna que externa. A insuficiência em mim já é epidérmica! Ainda ouço nas ruas gritos para eu comprar. Não!... Não quero comprar o que eles acham o que eu devo comprar. Gritam para eu comer. Comer?... Não quero comer o que eles acham o que eu devo comer. E se eu vender a minha dor? Alguém compraria? E a minha fraqueza? Alguém daria algum dinheiro? Certamente, não. Então, não quero e não vou vender as minhas fraquezas. Vou valorizá-las um pouco mais para ver se consigo me vender por um pouco menos. Continuo o meu caminho... Mais uma placa? Ué... E leva o nome de Deus!?!? Afinal, Deus precisa de crachá? Eu me lembro quando todas as vezes que entro na Câmara Federal, os funcionários usam um crachá na hora do trabalho. Na saída, geralmente tiram o crachá. E se a igreja tirar o crachá, Deus sai do templo e da condição de funcionário da igreja? Ou continua dando expediente ali, no escritório-templo? Interessante... O escritório divino que leva o nome de templo de Deus é bem grande. Será que tentaram dimensioná-lo à largura e estatura de Deus? Se por fora o templo é bem grande, o espaço interno também deve ser imenso. Então, cabem os fracos neste templo? Caramba!... Como me sinto fraco!... Quantos fracos assim como eu cabem neste templo? Tem um cara aqui fora que pede para eu entrar. Pergunto o que tem lá dentro. Prontamente me responde com detalhes a natureza da reunião. Explica que naquele dia é culto de libertação e para eu entrar, ouvir a voz de Deus com o missionário fulano de tal. Voz de quem? A voz de Deus no templo? Ou a voz do deus do templo? Não seria melhor: a voz de Deus por acaso no templo? E o missionário? É somente nele que a boca de Deus é a boca de Deus? E ontem? Se eu tivesse vindo ontem, teria sido “liberto” ou teria que esperar amanhecer hoje? Tudo bem... Entro no templo... Ou não entro? Logo volto e arrisco mais uma pergunta para mim mesmo. Deus está só no templo? Que templo é este que faz da onipresença de Deus uma restritiva presença de Deus?
Quem me convidou para o templo percebeu que parei na porta e nas minhas reflexões. Logo insiste para eu entrar arriscando um argumento maior. “O missionário é o famoso fulano de tal e está pregando hoje. Entre para vê-lo!” Nisto fico mais estático ainda. Poxa!... Quem é este ilustre desconhecido? A maioria veio por causa do missionário? E se dissessem que Jesus estaria lá na esquina com os bêbados e as prostitutas? Acho que O confundiriam com um bêbado a mais. Já fizeram isto com Ele. Já li isto na Bíblia. Até o cinema inventou uma relação sexual entre Jesus com uma de suas seguidoras!
Decido: não vou entrar no templo como se o templo fosse o único espaço de Deus. Na verdade os templos engessam Deus. Nietzsche os chama de túmulos. Prefiro entrar inteiro em Deus com o que tenho e com o que sou.
Se eu entro inteiro em Deus, vivo o texto sagrado quando diz: “... quando estou fraco, então, sou forte.” 2 Cor. 12.10b
Estou fraco, porém sou forte.
No caminhar vou me rever. Assim vou caminhar o meu caminho. Somente os fortes caminham!
Vou me rever...
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