09/03/2015 - 06:01h
Wilson Mahana/Divulgação
Andy de Santis acredita que mais que educação financeira, é preciso ensinar para a sustentabilidade
A escola deve ensinar além das disciplinas tradicionais, como português, matemática e ciências? Na opinião da autora Andy de Santis, 39, a resposta é sim.
Para ela, o assunto -- dinheiro e como gastá-lo -- é uma boa oportunidade de trabalhar conceitos de diversas matérias, além de possibilitar o desenvolvimento de algumas competências e habilidades bastante úteis para a vida do futuro adulto.
Com o livro "Lições de Valor", editado pela Moderna, ela propõe um roteiro pedagógico em 12 módulos que pretende provocar reflexões sobre educação financeira, sustentabilidade e valores não apenas entre os estudantes, mas também entre os pais e os Professores.
O UOL conversou sobre dinheiro, recursos e valores com ela. Abaixo, trechos desta conversa.
UOL - O que é educação financeira?
Andy de Santis - Se você olhar pela ENEF (Estratégia Nacional de Educação Financeira), a ideia está mais ligada ao processo de apoiar as pessoas a conhecer melhor produtos e serviços financeiros e para tomar decisões financeiras [como de consumo, poupança, crédito] mais adequadas. No meu ponto de vista, ela não se limita apenas a entender números, planilhas, produtos financeiros. Tem mais a ver com nossos valores, o que é importante para nós, sonhos, plano de vida a até como escutamos a palavra "não".
UOL - Por que ensinar educação financeira na escola?
Andy de Santis - Uma das razões é que a escola pode ser o caminho para chegar na família. Às vezes, nem a própria família se deu conta [de como gasta seu dinheiro, de como faz suas escolhas], trata tudo como descartável [e desperdiça recursos]. A criança [o aluno] funciona como um multiplicador [dessa consciência financeira], como aconteceu com a preocupação com o meio ambiente.
Um segundo ponto é que somos todos aprendizes nesse tema. Com as mudanças econômicas [das duas últimas décadas], as famílias ainda não teriam criado repertório para educar seus filhos [para aumento do crédito e, consequentemente, do consumo, por exemplo]. Há pouco tempo começamos a fazer planejamento de longo prazo.
Na época da hiperinflação, dinheiro era como gelo -- era preciso gastar rápido, ou derretia nas mãos --, e os planos econômicos traziam insegurança -- lembra de quando sequestraram a poupança? Não era um bom cenário para pensar em planejar a longo prazo. Apesar das mudanças na economia, mais estável e segura, ainda temos muito a aprender sobre como usar o dinheiro e o crédito.
UOL - Por que trabalhar com alunos do fundamental 2?
Andy de Santis -É uma etapa em que as crianças estão se tornando adolescentes. Começam a ter acesso a dinheiro e têm alguma autonomia para gastá-lo. Também é uma idade em que a família começa a ter alguma dificuldade em dialogar [sobre os gastos deles].
Dá para trabalhar com os menores também. Mas de outra maneira. Para mim, é mais adequado exercitar com eles os conceitos de limites e de espera -- que são as essências por trás dos conceitos de poupança e escolhas -- sem ter que falar necessariamente em dinheiro. É uma educação para a vida, aprender a se policiar, esperar, limitar, priorizar, escolher...
UOL - Qual seria o primeiro passo para se educar nessa área?
Andy de Santis - O primeiro passo, antes até de olhar para a planilha [de gastos e ganhos], é preciso entender os valores pessoais e familiares. Quais são suas prioridades? Depois, é importante destacar quais são os sonhos e os projetos. Onde queremos estar hoje, daqui a seis meses, um ano, dez anos? Criar uma visão de curto, médio e longo prazo -- e até definir o que são esses prazos porque cada um tem sua visão. O importante é construir a visão de onde quero, queremos estar.
Aí, então, olho para a fotografia financeira [uma lista dos ganhos e dos gastos]. Então, avalio. Por exemplo, se priorizo saúde, mas estou gastando muito com alimentos não-saudáveis, não há coerência. Estou desperdiçando energia na conquista dos meus objetivos. Outro exemplo é gastar com academia e com cigarro.
A ideia do livro é mostrar o bom uso dos recursos como um todo: tempo, dinheiro, trabalho, rede de relações. A pergunta é: Como você está alinhando os recursos na direção dos seus valores e dos seus sonhos?
O dinheiro entra nesse processo. Toda a decisão que tomamos passa pelo dinheiro.
UOL - Vivemos com pressa e você comenta sobre o tempo. Poderia falar um pouco mais?
Andy de Santis - Nossa atual visão do 'fast" [rápido] gera uma relação imediatista com o tempo. Precisamos entender -- e ensinar -- que os processos levam tempo. Se aos 20 anos, eu soubesse quanto dinheiro juntaria até a aposentadoria se poupasse R$ 100 por mês, hoje estaria em uma situação financeira melhor. O tempo é um forte aliado de quem quer poupar, fazer reserva.
UOL - Na sua opinião, qual é a importância do dinheiro?
Andy de Santis - É um viabilizador, uma energia de concretização. Dinheiro é um meio, não um fim em si mesmo. Para que você quer esse dinheiro? Tem que se perguntar. Até porque se não souber, ninguém consegue guardar dinheiro nessa sociedade em que a gente vive. A gente vive sendo assediado [para consumir e gastar].
O importante é o significado que dou para ele.
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