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Jovem cega é aprovada em 8º lugar no curso de serviço social da Uerj

03/02/2015 - 04:01h

Rafaela Lucy da Silva, de 26 anos, perdeu a visão em 2012 e fez o vestibular da Uerj com ajuda de um ledor (Foto: Arquivo pessoal/Rafaela Lucy da Silva)
Rafaela Lucy da Silva, de 26 anos, perdeu a visão
em 2012 e fez o Vestibular da Uerj com ajuda de
um ledor (Foto: Arquivo pessoal/Rafaela Lucy)

Desde que descobriu que havia sido aprovada no curso de serviço social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), a jovem Rafaela Lucy da Silva, de 26 anos, organiza sua mudança de Araruama, na região dos Lagos do Rio, para a capital fluminense. O sonho de entrar na Faculdade ela conquistou após três anos de estudo e, agora, o próximo é conseguir o diploma e trabalhar na área de cuidados com deficientes visuais. Cega desde 2012, Rafaela sofre de uma doença degenerativa na retina que a permite apenas diferenciar a noite e o dia, mas esse obstáculo não a impediu de ser aprovada na 8ª colocação no vestibular da Uerj para serviço social.

"Fiquei muito feliz", explicou ela, dizendo que tinha pouca esperança na aprovação. "Eu fiz pedido de cotas para deficiente, só que meu pedido foi indeferido porque esqueci de mandar algumas documentações, então achei que não fosse passar. No fundo, no fundo, a gente se sente diferente dos outros. Uma parte da gente acredita que a gente é capaz, e outra parte nega", disse.

A jovem fez as provas da Uerj e do Exame Nacional Do Ensino Médio (Enem) com o auxílio de um ledor. Essa foi a terceira vez consecutiva que ela fez o Enem e, na última edição, chegou a tirar 840 pontos na prova de redação.

A alta colocação no vestibular da Uerj é vista como "massagem no ego" por Rafaela, mas por poucos segundos. "Seria a mesma coisa se eu tivesse passado em último lugar também. O importante é passar."

Negação, e uma lupa alemã
Nos anos depois de concluir o ensino médio, a jovem decidiu não prestar vestibular porque não sabia o que fazer da vida. Quando tinha entre 19 e 20 anos, percebeu que precisaria de um diploma para conseguir um bom trabalho, e então resolver voltar a estudar. "Diploma não é garantia, mas é meio caminho andado. Foi a minha ideia, voltar a estudar, por isso procurei um oftalmologista, porque minha vista estava embaçada", lembra a jovem.

Após alguns exames, o médico lhe deu o diagnóstico: amaurose congênita de leber, uma doença degenerativa na retina que não tem cura.

A data da notícia Rafaela lembra até hoje: "Em 5 de fevereiro de 2010 recebi o diagnóstico, já vão fazer cinco anos. Passei muito tempo sem acreditar. Levei um ano e meio para aceitar que ia ter que buscar ajuda, que não ia ter como, que eu ia ficar cega, que a família não ia saber lidar comigo."

Em agosto de 2011, já com apenas entre 5% e 10% da visão, ela começou a fazer um curso de reabilitação no Instituto Benjamin Constant, com a ajuda de um amigo. O mesmo amigo, segundo ela, a presenteou com o objeto que a inspirou a voltar a estudar: uma lupa monocular (de um olho só) feita na Alemanha e que custava cerca de R$ 6 mil. "E ele me deu de presente, daí fiquei muito, muito motivafa. Voltei a ler, foi aí que comecei a procurar os cursos para fazer."

Seria a mesma coisa se eu tivesse passado em último lugar também. O importante é passar"

Rafaela Lucy da Silva

Cursinho e gratidão
Rafaela diz que, em um exame de acuidade visual feito em 2012, ela já tinha recebido a notícia de que se encaixava na categoria de pessoas totalmente cegas. Apesar de ter concluído o ensino médio antes do diagnóstico da doença, ela afirma que precisou aprender a se readpatar ao mundo, o que incluiu os estudos.

Em 2012, a jovem fez cursinho pré-vestibular, mas decidiu estudar sozinha em 2013. No ano passado, ela se matriculou no Curso Ceda, onde os professores, segundo Rafaela, a ajudaram a lidar melhor com o português. "Acho que 50% da minha nota eu devo a eles", explicou ela, que usava um gravador para registrar as aulas, ou levava um notebook com um software específico para a sala de aula.

Para a estudante, as matérias de história e geografia são as mais fáceis, e português ganhou dificuldade principalmente por causa da ortografia, agora que ela não pode ler em português, apenas em braile. "Das exatas eu não gosto", admite ela.

Futuro
Depois do que ela considerou um "baque completo", a garota tímida "que veio do mato", segundo Rafaela descreve a si mesma, decidiu não deixar os obstáculos a impedirem de conquistar seus sonhos.

Enquanto as aulas na Uerj não começam, Rafaela, que foi criada pela avó e por um tio em Araruama, já organiza a mudança para a casa de outro tio, que mora no Rio e vai acolher a jovem. Além disso, ela já traça novos planos. "Comecei hoje [segunda-feira, dia 2] minha preparação para concurso público, porque é minha segunda meta. A gente tem que meta na vida."

Mesmo assim, ela mantém os pés no chão e diz que pretende se esforçar. "Eu sou só mais uma na multidão. Tem um monte de gente como eu por aí, um monte de história bonita. Eu sou um grão de areia nessa terra infinita. Sei que todo mundo pode ser alguém na vida", disse.



Fonte: G1


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