15/08/2014 - 06:01h
A Medalha Fields que o carioca Artur Ávila Cordeiro de Melo, de 35 anos, recebeu na noite de terça-feira (12) pelo seu trabalho de pesquisa em matemática foi comemorada por adolescentes que passam hoje pela mesma experiência que Ávila viveu há duas décadas: a participação em olimpíadas do conhecimento para estudantes do ensino médio, e o sonho de seguir a carreira acadêmica e científica. "Eu estava torcendo, agora ele é reconhecido nesse meio por causa da medalha", afirmou nesta quarta-feira (13) Lucas Pereira Galvão de Barros, de 16 anos, que desde os 12 participa de olimpíadas e já ganhou 22 medalhas, a maioria delas em matemática.
Reunidos na sala de estudos avançados do Colégio Objetivo Integrado, na Avenida Paulista, Lucas e seus colegas Ana Figueiredo de Jesus, de 16 anos, Giovani Hidalgo Ceotto, de 17, e Leonardo Henrique Martins Florentino, de 16, tentaram explicar a importância do feito de Ávila, que comemoraram como uma fonte de inspiração "o matemático é o primeiro brasileiro homenageado com a Medalha Fields (veja no vídeo ao lado).
Os jovens, que juntos venceram mais de 50 medalhas até hoje, disseram que acompanhavam as notícias sobre o prêmio e sabiam da possibilidade da conquista do carioca do Impa, mas que ainda assim torceram para que ela se confirmasse.
"É algo que pode abrir uma porta, se o pessoal sentir o feito que realmente foi", disse Giovani, que cursa o terceiro ano do ensino médio e pretende fazer Faculdade de engenharia. Na noite de terça, quando Ávila subiu ao palco da cerimônia da abertura do Congresso Internacional de Matemática, em Seul, Giovani foi até o site do evento para ler mais sobre o trabalho do matemático brasileiro.
Segundo o adolescente, entre as áreas nas quais Ávila se destacou, e pelas quais foi agraciado com o prêmio máximo em matemática, estão a análise de sistemas dinâmicos e os operadores da Equação de Schrödinger.
Para os alunos, que cursam o ensino médio regular pela manhã e têm aulas específicas de treinamento para as olimpíadas à tarde, mesmo a grande repercussão que o prêmio do brasileiro teve ainda mostra o preconceito com que a matemática e a ciência em geral é tratada. "Disseram que ganhou, mas não explicaram a pesquisa dele", afirmou Ana, aluna do segundo ano do ensino médio e futura vestibulanda de medicina.
"O pessoal tem muito preconceito com a matemática do colégio e acha que o que ele faz é a mesma coisa, mas não é", explicou Lucas, que pretende seguir carreira na área de computação ou economia. "Muitas vezes as áreas que ele pesquisa podem ter utilidade real", complementou Leonardo, bolsista do Instituto Ismart que passou da escola pública para a particular no quinto ano do fundamental, aos 10 anos.
'Quem sabe eu não consigo chegar lá'
Daniel Santana Rocha cursa mestrado em matemática pura no Impa (Foto: Vanessa Fajardo/ G1)
Daniel Santana Rocha, de 17 anos, ainda nem terminou o ensino médio, mas já concluiu o mestrado no Impa e, extraoficialmente, cursa algumas aulas do doutorado em matemática. Para ele, a Medalha Fields de Artur Ávila serve de inspiração, até porque o 'Nobel' da matemática também estudou no Impa. "É um grande feito, já conversei com o Ávila, vi palestras dele e acho seu trabalho na matemática muito bacana. É uma inspiração, eu acho que posso chegar longe se me esforçar bastante, quem sabe não consigo chegar lá Estou começando minha carreira agora."
No começo do ano, como já vai ter terminado o ensino médio, Daniel vai disputar uma vaga na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) no Curso De Graduação em matemática, via Enem. Pretende cursar a graduação e o doutorado concomitantemente, e assim que concluir o curso de graduação terá direito a receber os certificados de pós. Agora, como ele ainda não é formado, não pode receber o diploma de mestrado, apesar de já tê-lo concluído.
Daniel conheceu o Impa aos 11 anos, quando foi acompanhar o pai, que é professor, num aula, e foi para lousa resolver um problema que ninguém estava conseguindo. Aos 12, foi convidado a fazer um curso de férias sobre análise de reta.
"O Impa é a excelência em ensino e pesquisa. Quando eu comecei aqui ninguém conhecia, eu acho que o prêmio vai ser muito bom para o Impa e para as olimpíadas. As pessoas vão começar a se inspirar, vejo muita gente boa em matemática, mas que precisa de um empurrão."
'Víciados' em olimpíadas
Giovani Ceotto e Leonardo Florentino se especializaram nas olimpíadas de física e de química (Foto: Ana Carolina Moreno/G1)
Do grupo de alunos paulistanos que conversou com o G1, Leonardo foi o que teve mais cedo sua iniciação em olimpíadas do conhecimento: aos dez anos, ele participou de uma sobre astronomia que aceita alunos mais novos. A preparação, segundo ele, envolve aulas com conteúdo lúdico para os pequenos, e nele o efeito foi estimular sua curiosidade sobre a área. "Conforme você vai participando, o nível fica mais sério, mais aprofundado. Aí você chega no ensino médio conhecendo coisas que só veria no ensino superior", disse.
Do grupo, apenas Giovani começou "tarde" a participar de olimpíadas: no 9º ano do fundamental. Ana e Lucas competem desde os 11 e os 12 anos, respectivamente. "Estudava em uma escola em que nem sabia que essas coisas existiam. Aí uma professora de física inscreveu a gente. Gostei muito", disse.
Embora os adolescentes tenham o costume de entrar em todas as competições desse tipo, com o tempo, o interesse acabo fazendo com que se especializem em uma ou duas disciplinas: Ana diz que se dedica mais às de matemática e física. Lucas prioriza as de informática e de matemática, e Leonardo e Giovani são especialistas nas completições de física e química.
A preocupação de Giovani, que neste ano conclui o ensino médio e deixa de poder participar das próximas olimpíadas, é achar outras competições voltadas a alunos do ensino superior. "Estou triste de parar de fazer, mas já estou pesquisando outras competições", disse ele: na área de engenharia, os torneios principais envolvem a construção de carros de corrida, explica.
Lucas afirma que o Brasil já oferece bastante estímulo aos estudantes do ensino médio com as olimpíadas do conhecimento, mas que, depois de formados, a situação muda. "Eu gosto de matemática, mas a pesquisa é uma coisa ingrata no Brasil. Nas olimpíadas tem muito incentivo, conheço muitas pessoas que gostam das mesmas coisas, mas depois, na pesquisa, isso não acontece muito." Por isso, os três meninos têm como primeira opção fazer faculdade nas melhores Universidades dos Estados Unidos, se conseguirem bolsa. Ana, que quer ser médica, mas se dedicar à pesquisa, afirma que para ela o melhor caminho é permanecer no Brasil.
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