22/08/2014 - 15:01h
Katsumi Kasahara - 5.fev.2004/AP
Talvez o livro deixe de ser em papel, mas ele não desaparecerá segundo os especialistas
O futuro do livro na educação e como as novas tecnologias estão transformando a forma com que os conteúdos didáticos são oferecidos aos alunos serão alguns dos temas discutidos durante esta a 23ª Bienal Internacional do Livro, que acontece entre os dias 22 e 30 de agosto, em São Paulo.
Para alguns profissionais da área ouvidos pelo UOL, o livro "de papel" não será totalmente substituído pelos digitais, no entanto, ele sofrerá mudanças significativas. A maioria acredita que o formato digital facilita o compartilhamento da informação e amplia o acesso ao conhecimento. Para eles, o impresso e o digital caminharão juntos por muitos anos ainda.
A seguir, as opiniões dos pesquisadores e profissionais da área:
Amanda Ramalho, coordenadora do Projeto SciELO Books, biblioteca eletrônica focada na publicação de periódicos científicos brasileiros.
O surgimento de novas ferramentas e tecnologias não implica eliminar as antigas -- e o mesmo acontece com o livro, pelo menos por um bom tempo ainda. A forma digital prevalecerá no futuro, mas o importante é que o livro enquanto conteúdo permanecerá. O papel é simplesmente um meio como é o digital.
A inclusão digital das escolas incorporará novas formas de aprendizagem aproveitando as facilidades que os conteúdos e interfaces digitais multimídias trazem para a educação. E os livros que serão mais e mais multimídia com leituras farão parte desse contexto. O aluno terá mais curiosidade e será melhor estimulado por textos escolares e literatura que incorporam as novas tecnologias e com experiências de leituras compartilhadas nas redes sociais.
José Tadeu Terra, físico, consultor da Coema Educacional, especializada em aprendizagem digital
Considerando que o livro é um conjunto de textos e imagens construído de forma ordenada para fins educacionais ou literários, reunidos de forma coesa e coerente, o que iremos viver é seu enriquecimento com uma linguagem multimodal, interatividade e uma maior facilidade de acesso e transporte com a troca do meio de distribuição (digital X impresso).
No futuro, a grande transformação será dará pelas plataformas educativas adaptativas, onde além da interatividade teremos colaboração, redes sociais e currículos personalizados.
Lucia Santaella, doutora em teoria literária e professora da PUCSP
A primeira coisa a fazer para compreender o destino do livro é pensar o livro de maneira um pouco menos rasa do que confundi-lo apenas com o suporte da linguagem escrita. A mim não parece haver dúvidas de que estamos atravessando um momento de transição e de passagem do livro em papel para o livro digital.
[De modo geral] penso que o livro, enquanto modo de organização da informação, especialmente a informação especializada, não morrerá jamais, esteja ele em que suporte for. Ou seja, pode estar nas redes, ou em um suporte como os e-readers, pouco importa, o livro é a maneira otimizada de estruturar os conteúdos de um tema ou temas, de modo a desenvolver no leitor o conhecimento sistematizado sobre esse tema. Tudo depende da escolha do melhor modo de se transmitir o conteúdo de acordo com a linguagem que melhor seja capaz de realizar o que lhe cabe.
Tenho defendido a ideia de que o primeiro livro em papel que irá desaparecer é o livro didático. A hipermídia, como linguagem feita da mistura de linguagens, verbais, imagéticas, sonoras e audiovisuais, está altamente equipada para que conteúdos de disciplinas como ciências, matemática, artes, história, geografia e tantos outros possam ser assimilados a partir do potencial que as multilinguagens da hipermídia oferecem. Imagine um texto sobre biologia em um tablet poder ser ilustrado com vídeos e mesmo, com realidade aumentada. Os recursos são muitos. Basta nos livrarmos de nostalgias para as quais o nosso tempo não dá mais lugar.
Marisa Lajolo, doutora em letras pela USP e professora da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Acho que o livro ?" no formato em que o conhecemos hoje ?" permanecerá por um bom tempo instrumento muito importante de educação. Ao longo dos séculos, livros aprenderam a conviver com outros suportes de informação: a fotografia, o rádio, o cinema, a televisão. Acho que não será diferente com a internet e com livros digitais.
Creio que a escola, nos próximos anos, passará por um processo de multiplicação de "suportes de informação". Livros de papel e tinta convivendo com livros digitais, games e demais engenhocas que se valem de outras linguagens. Mas não custa lembrar que a linguagem digital, em grande parte, veicula informação em linguagem verbal escrita e falada e que, portanto, recursos de coerência, de coesão, de adequação vocabular, & similares requisitos continuam a fazer parte dos "saberes" com que a escola precisa familiarizar seus alunos.
Para livros didáticos, livros online favorecem consulta imediata a outras fontes, que permitem confronto/correção/aprofundamento de informação. Enciclopédias virtuais são muito mais portáteis do que suas antepassadas de papel. Isso incentiva a pesquisa.
Natália Montuori, gerente de publicação independente da Amazon
Com a minha experiência [em publicação independente na Amazon], acredito que qualquer ferramenta digital quebra a barreira geográfica e o mesmo se aplica à publicação digital.
Trazendo isso para a escola, a criatividade do aluno pode ser estimulada com a produção de conteúdo digital. Um Professor pode criar um projeto em que os estudantes possam desenvolver textos e publicá-los depois. É compartilhar o conhecimento de modo que outros tenham acesso. E o mesmo serve para o professor que deseja disseminar uma metodologia. Ele pode publicar seu conteúdo e divulgá-lo para outras pessoas. As novas tecnologias facilitam a disseminação de conteúdo.
Renato Moriconi, escritor e artista gráfico
As novas tecnologias, em vez de substituírem, ressaltaram a comunicação do livro como objeto, abrindo assim mais espaço para discussões sobre ele no ambiente acadêmico, em sala de aula, cursos livres etc. O livro pode, sim, desaparecer futuramente como objeto de comunicação de massa, por questões de mercado, ecológicas, entre outras, porém, ele é insubstituível. Vejo cada vez mais artistas elegendo esse suporte para se expressar, publicando de forma independente ou por pequenas editoras.
Eu acredito na boa convivência entre diferentes meios de comunicação, mesmo dentro de uma sala de aula informatizada. O eletrônico e o virtual são maravilhosos, mas têm suas limitações. Tocar em uma tela é bem diferente de tocar em uma folha de papel. Dia desses vi uma criança enfiando a mão num vaso cheio de terra. Ficou um bom tempo ali, curtindo aquela experiência. Uma foto daquela terra, em um gadget qualquer, com todos os hiperlinks e informações possíveis sobre aquele elemento natural, jamais permitira a experiência que aquela criança teve. Ler um livro tradicional, de papel, com tinta etc, é tocar na terra.
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